08 fevereiro, 2010

Faro - San remo - Faro...................continuação 13


Durante toda a noite senti o movimento de carros á volta de nós mas nem por isso me preocupei em tirar a cabeça de fora do saco-cama para tentar vislumbrar alguma coisa e saber o que se passava. Tentei dormir o melhor possivel a pesar de tudo, o Paulo fez o mesmo.
Sete da manhã e fui forçado a acordar com a intensidade da luz do sol que já tinha mais de meia hora de aparecer no horizonte. Olhei á volta e incrédulo, vi que estávamos práticamente no meio de um parque de estacionamento improvisado ao pé da areia da praia, muitos eram os rodados marcados no chão por todo o lado, fiquei pasmado com a sorte que tivemos em ninguém nos ter passado por cima sem querer, ficámos com a idéia que aquela era uma praia muito concorrida durante a noite por casais a namorar em carros e sabe-se lá que mais.
O nosso pequeno almoço foram baguetes de pão barradas com latinhas de doçe de laranja e pacotinhos de leite com chocolate, um luxo, do tipo pequeno almoço continental, a seguir foi vestir o fato de banho, ir a correr para a água e mergulhar, ficámos foi um bocado salgados e com o desconforto que isso provoca, apenas uma questão de hábito, de resto, soube muito bem aquele banho de mar matinal. Arrumá-mos o material em cima das motos em dez minutos, depois, pôr estas máquinas infernais a bombar é sempre uma emoção, gasolina aberta, fechar o interruptor de ar do carborador puxando o manipulo para fora, abrir ligeiramente o punho do acelerador, desligar luzes, confirmar na manete das mudanças a posição de ponto morto (muito importante) e "quicada". As primeiras explosões abafadas na panela de escape são como música para os meus ouvidos, imediatamente empurro o embolo do ar para dentro abrindo assim mais circulação ao ar e empobrecendo a mistura gasosa no carborador, agora sim, a rotação baixa um pouco e as batidas dos motores das duas vespas a trabalhar ao mesmo tempo em sintonia são uma verdadeira orquestra de percursão. Eu e o Paulo sem que tivésse-mos combinado nada começá-mos a fingir dançar uma espécie de "kuduro" ao som daquele ritmo, mais uma vez foi gargalhada geral, o pessoal que chegava naquele momento á praia e que reparáva-mos agora, estarem completamente fixos nas nossas figurinhas de bandoleiros de circo e no espetáculo que nós ali tinha-mos improvisado, riam-se também connosco e alguns tiraram-nos fotografias, só faltou irmos de seguida com um capaçete na mão pedir umas moedinhas.
Já a rolar estrada fora e passado um bom bocado eu e o Paulo ainda nos ria-mos do episódio do "kuduro".

04 fevereiro, 2010

Faro - San remo - Faro...................continuação 12


A fome ia já apertando, por isso decidimos que antes de qualquer outra coisa ia-mos procurar um sítio para jantar. A ideia de um arroz á valenciana já vinha de trás, por isso, pará-mos assim que vi-mos um restaurante com esplanada a anunciar o prato a um preço razoável. Estaciona-mos as máquinas mesmo em frente de modo a ficarem ao alcance das nossa vistas, havia espaço para isso, e assim não havia necessidade de descarregar nada, só tinha-mos que dar uma olhadela de vez em quando, não fossem os amigos do alheio lembrarem-se que alguma das nossas coisas lhes dé-se jeito.
O arroz estava divinal e o branco fresco “La Rioja” que o acompanhou não se deixou ficar para trás, apenas o cafézinho é que não estava aquela coisa a que nós como bons portugueses que somos, estamos habituados, até a miúda que nos serviu era bonita e simpática, o Paulo já queria que ela viesse conosco, ela ria-se com um ar envergonhado ao mesmo tempo que lhe respondia que não podia, e das razões que a impossibilitavam, eu observava a cena e ria-me também com as “tangas” que o Paulo dava á valenciana Pilar, de seu nome. De facto, lata não lhe faltava.
As vespas até agora continuavam sem grandes problemas, não falando dos travões do Paulo nem do meu cabo de embraiagem, o ultimo que lhe montara continuava sem dar mostras de querer ceder apesar de tudo.
Ficou decidido durante o jantar, aproveitando o facto de estar uma noite cálida que mais parecia verão, que nesta, ia-mos dormir na praia. Os sacos-cama que trazia-mos iam finalmente ter uso, e além disso, podia-mos também poupar algum dinheiro para o resto. Despedimo-nos da Pilar com o coração aos saltinhos, não sei se por culpa dela ou do “La Rioja”, desejou-nos sorte para o que nos faltava da viagem, e, ou foi da minha vista ou eu vi mesmo uma lagriminha a escorrer-lhe pela face quando acenou.
Arrancámos para estrada já eram dez da noite. As vespas pegaram ambas bem com uma quicada, olhámos um para o outro e rimo-nos com ar confiante, o trabalhar redondinho e sem oscilações de rotação mantinha-se inalterado em ambas as vespas, e assim, arrancámos dali de estômago e coração cheios, á procura da primeira praia onde parar para prenoitar.
Logo á saída de Valência reparámos numa indicação para a direita, “Playa de la Patacona”, o Paulo que ia á frente na altura divergiu para lá e eu fui a trás. O nome desta praia tinha algo de similar com o de uma terra próxima á nossa Faro que se chama Patacão, até costuma-mos brincar com o nome que se dá ás meninas originárias dessa localidade.
Chegá-mos a um sitio amplo e arenoso na orla da praia, não via-mos mas ouvia-mos o marulhar das ondas na areia, fizemos sinal de ok um ao outro e ali abancámos. Devia-mos estar a uns 50metros se tanto da água, e o céu, que estava completamente limpo de nuvens, mostrava-nos agora a grandeza infinita do universo através dos milhares, talvez milhões de pequenos pontos de luz a que chama-mos estrelas. Aconchegados nos sacos-cama com as vespas por trás a proteger-nos do vento e a garrafa do medronho entre nós, filosofá-mos sobre imensas coisas durante quase uma hora, o dia seguinte, as avarias, a Pilar e o universo. Adormeci a olhar o céu e depois de ter exclamado qualquer coisa a respeito da imensa sensação de liberdade que estava a sentir naquele momento.